O ser humano é um ser racional e reacional e muitas vezes essa capacidade privilegiada de raciocinar e refletir gera um grande impacto no âmbito emocional, que, por sua vez, promove distintas alterações nos diversos órgãos e sistemas — notadamente no aparelho cardiovascular. As nossas reações orgânicas ao stresse são individuais e influenciadas por características de personalidade, oscilações hormonais e fatores externos. Mas, nos últimos tempos, todos nós fomos desafiados pela pandemia do coronavírus, que aumenta expectativas e incertezas que se refletem no equilíbrio da mente e do corpo.
Com a pandemia, as pessoas deixaram de ser as mesmas do ponto de vista psíquico, e a apreensão, a angústia, a ansiedade e a depressão tornaram-se mais comuns em todos os ambientes sociais. É um panorama que contribui inevitavelmente para mudanças emocionais e comportamentais capazes de repercutir no coração, favorecendo o surgimento ou o agravamento de doenças cardiovasculares.
Quando passamos por uma situação que desencadeia o stress e a ansiedade, libertamos hormonas que podem levar ao aumento dos níveis tensionais. Esses fatores podem causar picos de pressão em pessoas que possuem a pressão arterial normal e também se podem alterar ainda mais nos indivíduos que já possuem o diagnóstico de hipertensão arterial.
Estudos demonstram que pessoas depressivas ou que estão deprimidas apresentam maior risco de morrer de uma causa cardiovascular. E apontam ainda para que adultos com mais de 50 anos que estejam a passar por uma depressão, têm um risco duas vezes maior de sofrer um acidente vascular cerebral (AVC).
Têm sido feitas investigações que relacionam o stress e depressão na rotina, e a probabilidade de ter entupimentos nas artérias do coração (a doença arterial coronariana). As artérias coronárias são estruturas essenciais para a irrigação e nutrição do músculo cardíaco e, quando se encontram cronicamente obstruídas por placas de gordura, levam a um enfarte.
O stress que atinge a mente e o que acomete o sistema cardiovascular estão intrinsecamente ligados em virtude de um agente fisiológico em comum, a resposta inflamatória. O stress gera inflamação. Quando estamos sobrecarregados, ansiosos, deprimidos ou inseguros, libertamos hormonas do stress que desencadeiam um processo inflamatório e este não poupa os vasos sanguíneos, o coração e o cérebro.
Sabemos que a inflamação crônica contribui com o depósito gradual e progressivo das placas de gordura que entopem as artérias. Assim, conclui-se que pessoas stressadas tendem a ter mais enfartes em função da maior resposta inflamatória no organismo.
Voltando para os dias de hoje, nota-se que a pandemia mudou o estilo de vida de muitas pessoas. Grande parte da população passou a alimentar-se pior, a fazer menos atividade física e a enfrentar a tensão emocional. Precisamos de estar atentos a isto, inclusive porque a vivência de emoções negativas aumenta o risco de hipertensão e arritmias cardíacas.
Os circuitos neurais de uma pessoa ou seja, as inúmeras conexões entre os neurônios — são particularmente afetados em momentos de ansiedade e hostilidade, situação que amplia a escala e magnitude dos problemas cardiovasculares independentemente de outros hábitos, saudáveis ou não.
A Covid-19 mudou a conceção de vida das pessoas e tem provocado um profundo impacto social e emocional que pode transbordar para a saúde cardiovascular. Precisamos de aprender a conviver com a nova realidade, procurar alternativas para ter cuidado e prevenir a sobrecarga e, cientes da estreita ligação entre stress mental e o stress cardíaco, manter o acompanhamento médico em dia, pelo bem do coração.